Uma fazenda leiteira com 30 anos de atividade transformou-se num santuário animal na Colômbia — pela mão de um português.
Miguel Aparício e Nani Ramírez, ele português, ela colombiana, compraram o negócio de um casal de médicos veterinários cada vez menos interessados na produção de leite, cujas vacas agora pastam serenamente pelo terreno nas montanhas de La Calera, ao lado de cabras, cães, galos e ovelhas.
O chamado Santuário Animal Namign é o primeiro projeto que Miguel Aparício quer reproduzir em Portugal. Miguel Aparício quer encontrar, em Portugal, interessados em converter negócios de exploração animal em santuários ou projetos de ecoturismo.
“As indústrias pecuárias têm um impacto ambiental brutal. A ideia é ajudar a fazer esta mudança de uma maneira rentável, mas deixando os animais em paz”, diz Miguel Aparício, que já em Portugal se manifestava pelo fim da exploração animal.
Durante os sucessivos confinamentos para conter a pandemia, com as pessoas fechadas em casa, os movimentos dificultados e as ruas vazias, tornava-se mais difícil ignorar os “animais amarrados aos postes, à espera de serem levados por um caminhão para o matadouro”. Os caminhões poderiam demorar dias para recolhê-los.
“Vejo muitos bezerros machos, sem valor econômico para a indústria leiteira, amarrados nas beiras de estrada”, relata. Miguel Aparício, 41 anos, vive rodeado de fazendas leiteiras que abastecem a Alpina, uma empresa colombiana de lacticínios que vende para a Colômbia, Venezuela, Equador e Estados Unidos.
Mas foi uma ovelha que os desconcertou. “Estava há dias amarrada a chorar”, conta Miguel. Queria saber de quem era e se a podia libertar, embora tenha aprendido que, na zona rural onde vivem, nos arredores da vertiginosa Bogotá, os vizinhos “não gostam muito de perguntas” e menos ainda de atos de ativismo à revelia.
“Chegamos a um acordo. A nossa visão não é atacar, é trabalhar com as pessoas para criar mudanças”, diz o consultor. A ovelha Renata juntou-se aos cães que resgatavam e alimentavam, com a ajuda dos cuidados do médico veterinário Carlos Mario Jaramillo, também produtor de leite.
“Como veterinário estava a tentar resolver um problema que, enquanto produtor, causava”, diz Miguel Aparício. A fundação sem fins lucrativos é “majoritariamente” financiada com os rendimentos de Miguel e Nani, enquanto o projeto de visitas e de ecoturismo não gera mais lucros para cobrir os custos de alimentação, cuidados veterinários e renda da fazenda.
Para fazer face às despesas iniciais (cerca de 25 mil euros), o casal lançou uma angariação de fundos, em 2021, e apela a donativos frequentemente através das redes sociais.
Leva cerca de seis meses para se fazer a transição de uma leitaria para um santuário animal de 55 hectares, onde as instalações da ordenha “são agora usadas como armazém e zonas de recobro”.
Além das vacas e bezerros da antiga fazenda leiteira, o Santuário Animal Namign alberga “animais de todo o país”, incluindo vítimas de maus tratos que as autoridades colombianas lhes entregam, diz Miguel Aparício.
Os casos mais comuns são cavalos mais velhos, acrescenta, à medida que Bogotá avança com a proibição das carroças puxadas por burros e cavalos, conhecidas como “zorras”. Mas o português gostaria ainda de criar santuários para touros de lides e hipopótamos – duas espécies a “precisar de proteção” na Colômbia.
Espera-se que as touradas sejam proibidas no país que elegeu em junho o primeiro Presidente de esquerda, dias antes de uma bancada numa praça de touros ruir e provocar pelo menos quatro mortes.
Ainda enquanto presidente da Câmara de Bogotá, Gustavo Petro revogou em 2012 o contrato de arrendamento da praça de touros Santamaria com a empresa privada que geria a arena na mega-cidade colombiana.
O Governo também tem em mãos uma inusitada herança de Pablo Escobar: 133 hipopótamos, uma espécie que o narcotraficante introduziu na Colômbia e que se reproduziu ferozmente, ao ponto de ser classificada como espécie exótica invasora.
Miguel Aparício e Nani Ramírez
criaram uma petição online para pedir ao Ministério do Ambiente da Colômbia que
arranje outras formas de ajudar os hipopótamos que descendem de vítimas de
tráfico ilegal de animais exóticos.
“São animais tremendos. O Governo anterior parecia querer uma exterminação, mas vamos apresentar um projeto ao novo governo para criar um santuário de hipopótamos, limitando o risco que terminem todos mortos numa caça ao troféu”, diz Miguel.
A petição no change.org recolheu 18 mil assinaturas, contra críticas que dizem ser uma solução econômica e tecnicamente inviável. Para Miguel Aparício, as soluções que funcionam são “vantajosas para todos”.
“Quando se trata de dar aos animais o respeito que merecem, o veganismo é a resposta, claro, mas precisamos encontrar soluções pragmáticas para ajudar os animais nas atividades de exploração animal e os próprios agricultores”, escreveu, como mote do projeto que, na sua opinião, é uma prova de como uma “mudança tão importante é possível e apoiada pela comunidade dos direitos dos animais”.
Reportagem jornal público.pt
Redatora, Blogueira, Revisora, Escritora, Vegana. Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos |
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